Por Mauricio Ruiz
Há alguns dias atrás, no primeiro texto da série que estou escrevendo aqui pro Game Audio Academy, tentei fazer uma analogia entre a importância de uma mix, e forma com que fazemos um bolo. Em resumo: não adianta ter os ingredientes certos (harmonia, melodia e instrumentação), se você não consegue junta-los de forma correta e coesa. Se isso for feito errado, a música desanda.
Sei que nem sempre podemos contar com um engenheiro de mixagem, por diversas razões (quase sempre é uma questão de $$). O ideal é sempre termos alguém especializado fazendo esse papel, e pra isso, deixo uma dica: procure um mixer que você goste do trabalho e que esteja no mesmo estágio profissional que você. Então conversem e tentem uma parceria. Isso geralmente é bom para ambas as partes, e ajuda no desenvolvimento dos profissionais.
Bem, de qualquer forma, existem vezes em que nós mesmos queremos mixar nossas músicas. Por isso queria dar algumas dicas básicas nesse texto pra ajudar quem está começando.
1. Conheça seu equipamento: isso é imprescindível! Não precisamos ter equipamentos topo de linha e consoles NEVE para realizarmos uma mixagem honesta e que soe bem. Mas, para isso acontecer, você deve conhecer muito bem com o que está trabalhando. Quais são os limites e defeitos do seu equipamento? Como as grandes mixagens soam nele? Como ele te engana? Sobra grave? Falta grave? Falta detalhe? Soa comprimido? Referenciar muito, com músicas que você já conhece muito bem, é uma das formas mais eficientes de entendermos como o que temos disponível pode nos enganar em termos sonoros. É o ponto de partida, sempre.
2. Mixar é preencher todo o espectro de frequências: nosso ouvido é capaz de perceber frequências entre 20 Hz e 20 kHz, e mixar é a arte de preencher esse espectro de forma eficiente, de acordo com a sonoridade que se busca. A melhor dica pra quem está começando é buscar o equilíbrio - nem muito grave, nem muito agudo. Muito cuidado com o médio-grave (250 Hz – 500 Hz), ele faz sua mix soar confusa e pouco clara (muddy) e costuma ser a banda de frequência que mais gera problemas para quem está começando.
3. Frequências geram sensações: é importante saber onde “moram” e o que fazem as frequências com que estamos trabalhando. O grave mora no chão, sai “debaixo” das caixas; os médios costumam gerar presença e os agudos dão a sensação de “ar” e brilho pra um som.
4. O grave mora no centro: se existe uma coisa que não recomendo pra quem está começando a mixar, é brincar com o espectro grave de uma música. Ele mora no centro. Baixo, bumbo, tímpano, etc. O grave possui muita energia, e por isso costuma soar melhor no centro. Além disso, por “morar no chão”, o grave não nos dá a sensação de direção, o que nos traz dificuldade de saber de onde vem (assim, direciona-lo para esquerda ou direita é um tanto inútil).
5. Equalizar é mais cortar do que adicionar: temos a mania de começar equalizando algo adicionando frequências. Porém, o ideal é sempre cortar antes de adicionar. E não tenha medo de cortes grandes e extensos. Por exemplo, há casos em que utilizo um HPF (high-pass filter) em 300 ou 400 Hz, dependendo do instrumento. Em guitarras, é muito comum cortarmos tudo abaixo de 100 Hz. O mesmo acontece com vozes. Do outro lado, há instrumentos que não necessitam de nada acima de 8 kHz, por exemplo. Além disso, muitas vezes é melhor cortar o que sobra, ao invés de adicionar o que queremos. Por exemplo, se quisermos que a banda entre 1 kHz e 1.5 kHz se destaque em uma guitarra, é melhor cortarmos as bandas subjacentes (cortes em 700 Hz e 2 kHz).
6. Somos seres comparativos: o ser humano baseia suas percepções em comparações. Preste atenção à sua volta e repare como tudo é relativo. O que é “alto”? O que é “pequeno”? Assim sendo, não adianta querermos que tudo soe grande numa música. Para algo soar grande, algo deve soar menor. Para algo soar grave, outra coisa deve soar aguda. Cada instrumento deve ter seu espaço determinado, e seu tamanho correto. Encontre os elementos que você quer destacar/priorizar, e entenda qual a melhor forma de fazer isso. Lembre-se, quando tudo soa grande, nada soa grande.
7. Cuidado com compressores: eles são ferramentas incríveis e extremamente úteis, que mexem demais com a energia sonora de um elemento. Mas para utiliza-los de forma correta, deve-se conhecer a característica sonora de cada tipo e o que ele faz com o som. No começo, temos a tendência de comprimir demais os instrumentos, pois muitas vezes o efeito mais sutil é difícil de ser ouvido. Isso é um erro grave e pode criar uma mixagem muito plana, sem dinâmica e opaca. Na dúvida, opte por usar menos. Com o tempo, você vai entendendo como eles agem e como conseguir o efeito desejado.
8. Mono é seu aliado: sempre ouça sua mix em mono para saber que tudo está bem. Fazer isso nos ajuda a identificar problemas graves de fase e também a espacializar melhor nossos elementos. Ainda mais hoje em dia, quando mixamos para jogos mobile, onde muita gente vai ouvir aquilo através de uma pequena caixa, e só. Dica de ouro - pode parecer estranho, mas um professor certa vez me disse “quando estou com dificuldade de achar um espaço para algo na mix stereo, coloco ela em mono e vou fazendo um pan do objeto até que ele soe bem e destacado. Quando volto para stereo, na maioria das vezes preciso somente de pequenos ajustes para que ele se encaixe perfeitamente na mix”.
9. Ouça, ouça, ouça: ouça! Sim, ouvir é mais importante do que ver, ao mixar. Mixar no computador nos gerou um problema de que muitas vezes trabalhamos mais olhando os faders e knobs, e menos ouvindo o que estamos fazendo. Não se deixe levar pelo plugin bonito, ou pela curva de Eq. que parece “estranha”. Se te soa bem, se não está gerando problema indesejados, ta tudo certo. O importante é como aquilo soa, porque, no final, as pessoas não vão saber qual plugin você usou, ou se você cortou a guitarra em frequências pouco usuais. Tudo o que vai importar é se sua música soa bem.
10. Estude, estude, estude: estude! Sim, estudar é importante demais. Especialmente no Brasil temos uma péssima mania de achar que somente a prática nos serve. Não é verdade. Há coisas que só vamos conseguir entender e aprender se estudarmos como elas funcionam. Há conhecimentos que nos ajudam muito a mixar e ouvir melhor. Mais importante, que nos ajudam a traduzir através de técnicas e procedimentos a sonoridade de uma música ou instrumento. Eu estudo todos os dias, pelo menos um pouco. Estou sempre lendo coisas, das mais básicas às que não entendo nada (sim, há artigos que lemos e ficamos perdidos, mas eles nos dão informações e guias para onde começar a aprender coisas novas).
Bem, no próximo texto vou falar um pouco sobre algumas técnicas e também dar dicas de livros, vídeos e blogs para os que querem aprender sobre mixagem. Espero que tenham gostado! Um abraço, e até mais! :-)
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